Thursday, December 27, 2007

Isso porque não tinha lua

E ela veio que veio bonita na luz do café
Num é que ficou bonita na luz da paulista?
E daí inventou de ficar bonita na luz do cinema
De ficar bonita na luz do poste
Do lustre, do celular, do isqueiro
Um dia deu pra ficar bonita na luz do quarto
De lá prali mesmo, ficou bonita na luz do candeeiro
Dali ficou bonita na luz das velas
Depois bonita que só vendo com a luz do monitor
Até que só restou a ela ficar bonita na luz da rua.

Isso porque não tinha lua.

Garoa paulistana, ácida torrente.

Borrifam do invisível noturno águas de outono. Caindo no meu parabrisa, deixadas à canto por dedos que teimam à custa de vaivens tirar-lhes dos olhos. Quero estar fora. No teto. Na relva. Na areia. No léo. Arme-se de nuvens de vapor o meu redor como tempestade evocada pelas minhas aguras de garoto. Traga-me do infinito a senhora da terra. Senhorita. Mulher. Ofusque o ser imorbe aos seus pés com o desdém piedoso de uma deusa. Vim para fazer-me de ti, disse sem mover os lábios. E faz dos meus calados nascer desejos. Sou de ti desde o umbigo, mulher. Quero que ela me cave na pele sulcos onde corra essa mistura de água mal caída e já embebedada pelo suor dos nossos corpos. Unhas fincadas como troncos enclaves à margem, na beira dos meus nervos à flor da estação. Que caia nas fonículas de seus pêlos que a condensa e destila. Peço ou nem sei se ela ordena que eu receba nos olhos suas lágrimas pluviais, doce fel liquefaz.

hoje ela disse enfim

Hoje ela disse enfim
Que quer viver sem mim
Pediu a certeza para quem
Não sabe planejar
O amor insensato
Resiste por séculos
Aflorando em versos
Mas morre sozinho
Como nunca existiu
Tentei derramar lágrimas
Mas em pó se fez a fonte
Atravessou-me como a noite
A dor em mim nascente
A ausência fundamental
De órgãos essenciais
Nem tudo mas todos
Respiram menos depois de agora
Amanhã não tem porquê

Colégio Santa Úrsula Shopping Center

As escavadeiras não foram fundo o bastante pra alcançar o fim das raízes daquelas árvores que esperavam o fim do ano para encher as cestas das freiras, as latas dos pedreiros e os uniformes de crianças, para o horror de mães que custavam a tirar do azul primário o amarelo manga. O barulho das máquinas veio como uma tempestade e assim passou, mas a algazarra que se ouvia à entrada, no recreio e nas horas da saída anunciadas com músicas e sinos ainda zumbe gostoso no ouvido daqueles que por ali passaram e viveram. As franquias da moderna praça de alimentação não descobriram o segredo do molho de pimenta do seu Zé ou os ingredientes dos gelinhos que juntavam sempre à sua volta um enxame de meninos e meninas, refrescando a euforia da liberdade para depois tentar a sorte na roleta do tio do biju. As rodas de ciranda, os duelos de bafo, as peladas com garrafa de iogurte, queimada, basquete, pega-pega, pique-esconde supriam a diversão e condicionamento que hoje se busca nos fliperamas e academias – mais um alívio para as mães, que viram as taxas de joelho esfolado reduzirem drasticamente. Aliás, é para as mães que a coisa calhou bem. Vêm ali comprar seus uniformes exclusivos quando outrora tinham de os ir buscar lá na Av. Saudade para os filhos. Aprendiam-se os sacramentos com a Madre Helena 67 metros abaixo de onde outro dia passou Jesus Cristo segundo Mel Gibson. Às guloseimas da cantina não fazia concorrência qualquer supermercado. E o mimeógrafo dava mais barato que cópia colorida..

Não há mais Barriga Cheia na esquina da Garibaldi com a Prudente, Aldeia Nova ou À leste do Éden na Garibaldi com a Campos Salles, o alfaiate Felício já não é vizinho do barbeiro Hélio na Prudente, quase na São José, a janela do casarão da esquina da São josé e Campos Salles existe assim como o velho calado que emoldurava. Restam grandes prédios, com a sua infinidade de varandas e janelas viradas como camarotes para uma caixa de lembranças.

tom

dugudéum....dugudéum... implora a guitarra do rei bebê....pelo menos um que não fez carreira pro filho cheirar....aliás... o cheiro aqui, à vinagre, continua à espreita.... quando menos se espera, ao dobrar uma esquina, ao passar debaixo da janela da vizinha.... engraçado isso, se não fosse balsâmico... o telefone da sala toca... se for para mim há de tremer o telemóvel... aguardo o tom......em vão... o tom que ainda não captei, ou se pintou abafei pela seleção natural que custa a me deixar.... preciso..... como o relógio que custa a parar, insensível ao sol que teima não entardecer.... será preguiça ou covardia? que ponto da mala esconde o diapasão? careço afinação.....qual será o tom?

tudo se errou

O pianista foi tocar boi
O elefante casou com a formiga
Entregaram massa de pastel pro pizzaiolo
João conheceu ricardo
Maria, fabi
Tem bomba no iraque
E gente boa na casa branca

Nasceu carambola na jaqueira
A sicília tava no bom retiro
E eu, retirando

quero morrer de amor antes que seja tarde

Careço de todos os róques que falaram de amor
Gemeram suas guitarras pelo colo de uma mulher
Que de hora pra outra devorou todo o seu ser
No súbito fim do show passado
Ou da vida eterna colados sem desconfiar por quê
Quero todas as rosas faladeiras ou não
Quero os cravos e os espinhos
Os luares e por do sol
As rimas fáceis
As piegas de dor
Quero tudo isso ao mesmo tempo agora
Antes que seja tarde
Tem dias que não tem aurora
Quero as explosões de cazuza
A soturnez de vininha
A fossa de lou reed
O desespero de led zeppelin
A facilidade de jorge ben
Quero confortar-me no desassossego
Na sombra da dúvida deleita meu fel
E da minha certeza fizeram-me réu